Para muitos pais de crianças autistas, a seletividade alimentar transforma a refeição em um momento de estresse e preocupação.
Algumas crianças comem apenas 2 ou 3 tipos de alimentos, rejeitam novas texturas, choram diante de pratos “misturados” ou se recusam até a experimentar algo diferente.
E o que muitas famílias ouvem — “é só birra”, “deixa com fome que uma hora come” — geralmente piora o problema.
A verdade é que, no Transtorno do Espectro Autista (TEA), a seletividade alimentar não é teimosia: ela está relacionada a diferenças reais na forma como o cérebro da criança percebe cheiros, texturas, cores e sabores.
Por isso, é essencial compreender o que está por trás desse comportamento e buscar orientação adequada.
Entendendo a seletividade alimentar no autismo
Estudos mostram que até 70% das crianças com TEA apresentam algum grau de seletividade alimentar — desde recusa a determinados alimentos até restrição severa de grupos inteiros (frutas, vegetais, carnes, etc.).
Essa seletividade pode estar relacionada a três fatores principais:
- Aspectos sensoriais:
Crianças autistas podem apresentar hipersensibilidade ou hipossensibilidade a estímulos sensoriais.
Texturas “moles”, “grudentas” ou “crocrantes demais” podem causar desconforto real, assim como odores ou cores intensas. - Aspectos comportamentais:
Mudanças de rotina, apresentação diferente do prato ou novos alimentos podem gerar ansiedade.
A previsibilidade — comer sempre o mesmo alimento — dá sensação de segurança. - Aspectos gastrointestinais:
Algumas crianças apresentam refluxo, constipação ou dor abdominal, o que reforça a recusa alimentar por associação negativa.
É importante entender que cada criança autista tem um perfil alimentar único, e o tratamento deve respeitar esse funcionamento individual.
Quando a seletividade alimentar exige atenção médica
Nem toda criança “enjoada” para comer precisa de intervenção, mas há sinais de alerta que indicam necessidade de avaliação:
- Rejeita grupos alimentares inteiros (por exemplo, não come nenhum alimento de uma cor específica).
- Aceita apenas alimentos com mesma textura ou temperatura.
- Demonstra nojo, ânsia ou choro intenso diante de novas comidas.
- Apresenta perda de peso ou estagnação do crescimento.
- Evita até líquidos diferentes da água.
- Apresenta engasgos ou refluxo com frequência.
Nesses casos, a avaliação com pediatra e equipe multidisciplinar é essencial para garantir a segurança nutricional e emocional da criança.
O que os pais podem fazer em casa
Algumas atitudes simples podem ajudar a reduzir o estresse e aumentar gradualmente a aceitação de novos alimentos:
- Respeite o ritmo da criança:
Forçar ou pressionar só reforça a aversão.
O primeiro passo é tornar o momento da refeição agradável e previsível. - Mantenha uma rotina visual:
Crianças autistas se beneficiam de rotinas estruturadas.
Use figuras ou cartões para mostrar o que vai acontecer: “hora de lavar as mãos → sentar → comer → brincar”. - Apresente o novo alimento aos poucos:
Primeiro no prato, depois tocando, cheirando, e só mais tarde experimentando.
A exposição gradual é mais eficaz do que insistência imediata. - Evite esconder alimentos:
Misturar “escondido” pode gerar desconfiança e piorar a recusa.
A transparência é essencial para manter a confiança. - Use reforço positivo:
Valorize pequenas conquistas (“você tocou na banana hoje, parabéns!”).
A motivação positiva é muito mais poderosa do que punições. - Crie um ambiente calmo e previsível:
Evite distrações, ruídos e excesso de estímulos visuais.
O foco deve ser na refeição, não na pressão para “comer tudo”.
O papel do pediatra e da equipe multidisciplinar
O manejo da seletividade alimentar deve envolver avaliação médica e acompanhamento terapêutico.
Como pediatra com foco no Transtorno do Espectro Autista, posso:
- Avaliar o crescimento e o estado nutricional da criança.
- Identificar possíveis causas médicas, como refluxo, constipação ou intolerâncias.
- Orientar estratégias adequadas para o perfil sensorial da criança.
- Encaminhar para profissionais como fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e nutricionistas quando necessário.
Cada caso exige um plano individualizado, com metas realistas e acompanhamento contínuo.
Comer bem é possível, com paciência e orientação certa
A alimentação da criança autista não precisa ser motivo de sofrimento.
Com o olhar certo, paciência e suporte profissional, é possível transformar o momento da refeição em algo leve, prazeroso e seguro.
Você não precisa lidar com isso sozinho.
Se o seu filho apresenta seletividade alimentar, recusa de novos alimentos ou sinais de desconforto nas refeições, eu posso ajudar você a entender as causas, elaborar um plano prático e restaurar o prazer de comer com tranquilidade.
Agende uma consulta e vamos juntos construir um caminho saudável e acolhedor para o seu filho e para toda a família.